Antonio Montenegro

Em recente seminário internacional na Universidade Federal de Mato Grosso, uma das mesas redondas debateu o atual momento histórico do Brasil. Há algumas décadas o campo historiográfico rompeu com a perspectiva de que o distanciamento temporal era condição para produção de uma “imparcial” análise histórica.

Nesse cenário, muitos historiadores ao escreverem a história do tempo presente, recomendam alguns procedimentos metodológicos. Destaco três: primeiro, distanciar-se do ‘brilho’ dos acontecimentos imediatos que a tudo encandeia; segundo, associar o presente a outros fatos passados; terceiro, selecionar e analisar um conjunto diversificado de fatores que concorrem para produzir o presente vivenciado.

Ao adotar essa perspectiva de análise questiono o fato da mídia – escrita, falada, televisiva – instituir a corrupção e a violência como temas fundamentais e mais significativos da atualidade. Afinal, a história também ensina a interrogar discursos e práticas que se apresentam como evidentes.

Assim, ao estender o olhar para além do presente, encontro os profissionais responsáveis pela educação pública das crianças e jovens da nossa sociedade, submetidos a um regime de 40 horas semanais, e um piso salarial nacional de R$ 2.455.00, que, apesar de baixíssimo para a amplitude e complexidade da atividade realizada, tem o agravante de não ser cumprido em diversos estados e municípios. E essa situação ainda se revela mais trágica quando se confronta com a afirmação do DIESE de que o salário mínimo justo deveria ser de R$ 3.752.65. No entanto, esse mesmo Estado, patrão dos professores, paga aos vereadores, deputados, juízes, promotores, defensores públicos, entre outras categorias, salários e auxílios com valor acima de R$ 20 mil reais.

O geógrafo e professor francês Hervé Théry, em conferência no referido seminário internacional, comentou que se aposentou e veio trabalhar no Brasil. Havia atingido na França o grau máximo da carreira, com salário de € 4.200 e que o salário mínimo naquele país é de € 1.200. Este professor (como qualquer professor universitário no Brasil) ministrou aulas, orientou dezenas de dissertações e teses, realizou pesquisas, publicou dezenas de artigos e livros. Seu salário, ao final da carreira, não apresenta a enorme disparidade que se pratica no Brasil.

Em face desse cenário, não devemos refletir que o Estado brasileiro e seus agentes nos níveis federal, estadual e municipal, ao estabelecerem uma política de desigualdade salarial e social, produzem um dos mais graves problemas da atualidade?

 

Antonio Montenegro, é professor Titular do Departamento de História da UFPE.
Artigo publicado no Jornal do Commercio em 07/09/2018.

 

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