Impossível esquecer a borboleta azul que aparecia no pequeno riacho em que nos banhávamos todos os dias na bocaina onde ficava o sítio de Avani, amiga, e mãe de Iva e Léo Rocha. Era o ano de 1986. O sítio ficava encravado bem lá no fundo do Vale do Jamacá. Cercado de morros por todos os lados, vivíamos em estado de êxtase pela presença forte da natureza com toda sua mítica selvagem. Cada dia uma luta, limpeza, plantio de horta, pequenos reparos, fazer um som, escrever poemas e contos, ir à cidade, comprar mantimentos básicos e equipamentos para a lida diária, ir no vizinho comprar leite e queijos, um escambo aqui, outro ali, era uma vida mais leve e com um pé na utopia de se viver verdadeiramente em comunidade. Um hippismo que incomodava parte da sociedade tradicional de Chapada dos Guimarães, mas que se convivia com o mínimo de tolerância de ambas as partes.

Voltando à borboleta mágica que todos nós chamávamos de Fadinha, ela dava um baile de beleza e leveza, pousava quase roçando em cada um de nós, como uma recepção mágica, como um oi, estamos aqui, vamos viver em harmonia. Os dias passavam e sonhávamos todos com uma revolução dos costumes, no comportamento humano para um modo de vida mais comunitário, viver do essencial, equilibrando a vida com as necessidades econômicas, de produção, de consumo, de crescimento e etc. A ideia de crescimento econômico é que é a tônica marcante das diferenças entre um jeito e outro de encarar o mundo e todas as consequências de nossos atos e gestos e escolhas.

Viro a página, é o ano de 2020, os jornais, blogs, perfis nas redes sociais, replicam desesperadamente a situação de calamidade em que o fogo incendiário assola Mato Grosso, o Brasil de ponta a ponta queimando, inviabilizando a essência de um futuro melhor e possível. Sabemos que a situação pode ser reversível, mas que depende de tomadas de decisões urgentes e vitais para a vida do planeta.

A luta principal, naqueles anos de 1980, era pela criação do  Parque Nacional de Chapada dos Guimarães. A busca era de fortalecimento de uma luta pelo meio ambiente que avançou localmente com uma galera que movimentava a política de forma mais alternativa: Mario Friedlander, Regina e Mobi, Maria Lúcia, Malu, Ari, Manoel Português, Kell, Alice, Décio, Juarez e tantos outros parceiros amigos. Companheiros de luta com ideias que apontavam para um futuro de maior equilíbrio no planeta. Agora, o Jamacá grita por socorro, o Pantanal, o cerrado, a Amazônia, Mato Grosso, arde em chamas.

Foto de Mário Friedlander

Mário Friedlander estava recentemente no Pantanal como brigadista voluntário ajudando a controlar os incêndios que solapam aquele pedaço de paraíso. Teve que voltar correndo com a companheira Jeanne, pois seu pedaço de terra estava em chamas lá no Jamacá. Mário fala sobre sua trágica situação: ”Desde o dia 11 de setembro de 2020 que o fogo invadiu o Vale da Bocaína e Vale do Jamacá em Chapada dos Guimarães, onde vivo há 40 anos. Eu estava no Pantanal com minha parceira, de trabalho e de vida, Jeanne Martins, documentando e participando dos combates as queimadas como voluntários da Aecopan, tivemos que largar tudo e sair do Porto Jofre numa angustiante viagem atravessando uma paisagem apocalíptica onde antes era puro deleite.

Precisávamos chegar no Jamacá das Araras e nos dedicarmos exclusivamente a fortalecer nossa Brigada Rural Voluntária do Vale do Jamacá, formada por moradores do vale e por voluntários de outras regiões. Desde então, nossos dias e noites tem sido sobressaltados por pedidos de ajuda e depoimentos da destruição implacável causada por diversas frentes de fogo que não dão trégua, todo nosso tempo tem sido dedicado a solicitar ajuda para os moradores e para nossa Brigada, e também para conseguirmos apoio para a aquisição de equipamentos de proteção individual para nossos brigadistas voluntários além de equipamentos que sejam realmente eficientes no combate ao fogo devorador. Espero conseguir reunir mais voluntários que participem e nos ajudem, espero que mais pessoas venham nos ajudar a curar as feridas de nossa Mãe Terra”.

Foto de Mário Friedlander

Correu de volta, de um fogo a outro, onde atuar? Onde apagar primeiro? O que fazer para evitar tamanha tragédia? É preciso usar a inteligência e planejar os próximos anos, é urgente e necessário para evitar catástrofes como as que estão acontecendo agora por praticamente todo o país. São lugares ricos em diversidade, são verdadeiros santuários que precisam ser conservados para muitas finalidades e benefícios coletivos.

As características únicas do Vale do Jamacá, fazem do lugar uma área necessariamente de conservação, segundo Jeanne Martins: “O Vale do Jamacá nas Chapada dos Guiamarães-MT é um Ecótono, ou seja, ecocomunidade mista ou área de transição entre duas comunidades vizinhas,floresta amazônica e cerrado, apresentando algumas características e espécies próprias, sendo algumas extremamente raras, estando algumas delas sendo estudadas neste momento pois são espécies novas ainda não descritas pela ciência. As matas deste vale possuem algumas centenas de hectares com abundante presença de aves, mamíferos e diversos outros animais, de toda a cadeia alimentar, além de vegetação exuberante e peculiar.

Neste exato momento essa biodiversidade está ameaçada pelo fogo podendo ser dizimada a qualquer momento. Dezenas de hectares já foram queimados e o fogo caminha pela mata devorando tudo que encontra pela frente.”

É possível contribuir de várias formas. Como voluntário ingressando nas forças brigadistas de combate direto do fogo, como assistentes de várias atividades, seja de organização, de mobilização, de captação de recursos e inúmeras outras formas de participar, como também de optar por doações em dinheiro que ajudam e muito na organização e manutenção dos trabalhos.

Foto de Mário Friedlander

Campanha de doação para a Brigada Rural Voluntária do Vale do Jamacá para combate ao fogo:

Banco Sicredi nº 748

Agência 0802  Conta Corrente 12.807-6

Nome/Razão Conta: Grupo Semente

CNPJ:  07.489.480/0001-45

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