o dia parece ter 33 horas e não 24.

só faz uma semana e parece um mês.

é louco como o ritmo da cidade embala a gente, antes tudo frenético semtempopranada, agora tudo calmo (porém, em um pânico silencioso que só se manifesta todos os dias entre as 19h30 e 20h30 quando ouvimos o bater das panelas e os urros que variam de “bolsonaro vai tomar no cu” a “viva o SUS”). a liberdade em privação. a vida travada, pausada, o amor interrompido, a ansiedade de querer viver o futuro. as notícias viram gatilho, a gente entra em looping numa crise de ansiedade. ataque de pânico. acho que é melhor viver sem saber a atualização dos dados. eu decretei: vou ler notícias de 3 em 3 dias. a gente tem que ter consciência da realidade dos fatos, é eu sei. mas a realidade dos fatos faz o coração querer sair pela boca. eu antes detestava fazer chamada de vídeo, quando alguém me ligava de vez em quando eu até recusava.

comecei a minha quarentena no dia 16 de março, segunda passada. na quarta eu resolvi ir na farmácia e no mercado – pq realmente tava precisando, ok? – e as pessoas estavam impacientes, olhando feio umas pras outras, parecendo ter pressa e medo. medo de tocar, medo de respirar perto de quem não usa uma máscara, medo de esbarrar em vc mas se puder ela passa por cima. as pessoas já estão com fobia social.

agora a rotina é quando for fazer compras evitar usar brincos e acessórios, prender o cabelo, vestir um casaco, calçar uma bota e se tiver, vestir umas luvas. voltar e deixar o sapato pra fora de casa, entrar, passar álcool em tudo, na maçaneta e na chave, lava as mãos, tira a roupa, sacola plástica, higieniza os produtos, todos, um a um, minuciosamente em todos os cantinhos, toma um banho.

foi só a primeira semana, Carol, é por isso que tá tão difícil. já já você acostuma.

uma call com a equipe toda do trampo pra atualizar sobre as decisões da empresa, gatilho.

uma chamada de vídeo com quem eu amo, gatilho.

parece que nesse momento, tudo que fortalece machuca. mas ao mesmo tempo fortalece, só que machuca, entende?

a primeira previsão dizia de 40 a 60 dias. a segunda de até uns 90 dias maomeno. a terceira diz até setembro, na quarta já tão dizendo dezembro. “Juliana seu sonho é uma ilusão”. eu sonho todos os dias aqueles pesadelos de apocalipse. será que a gente tá vivendo tudo isso mesmo ou eu to na equipe de uma série e não me avisaram? “Amanhã não tem feira, não tem mais construção, não tem mais brincadeira, não tem mais confusão”.

é, acho que eu preciso meditar e fazer terapia.

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Economista, realizadora audiovisual, produtora e ativista cultural. A arte é intrínseca aos seus múltiplos olhares.

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