Por Antônio Torres Montenegro*

As relações que construímos com as pessoas são instituídas a partir do que aprendemos e interiorizamos em nossas mentes como verdade. Afinal lemos e agimos no mundo com os referenciais que aprendemos.

No entanto, nem sempre o que aprendemos, sobretudo na infância e adolescência, revela-se, na idade adulta, o mais adequado para uma convivência profissional e afetiva. Nesse aspecto, muito me impressionou a leitura do “Discurso do Método” do filósofo René Descartes. Por meio de uma escrita clara e agradável, afirmou que aos vinte e pouco anos, descobriu que as verdades que acreditava estavam carregadas de contradição. Quer as aprendidas na família, quer as dos mestres, quer as dos livros.

Cercado de dúvidas, isola-se para refletir. O passo seguinte foi a constatação de que a verdade da qual não duvida é que ele pensa. Logo, decide criar um método com quatro regras para examinar à luz da razão as verdades que lhe foram ensinadas. A primeira regra foi aceitar apenas como verdade o que se apresentasse de forma clara e objetiva. As regras seguintes implicavam a divisão, o estabelecimento de uma ordem do simples ao complexo e a generalização. Estava sistematizado o método científico que dominou a produção do conhecimento por quatro séculos.

Condenado e perseguido em sua época, Descartes abalara definitivamente a estrutura de saber e poder na Europa, dominada pela Igreja Católica que afirmava ser a Bíblia, lida com fé, a explicação para todo conhecimento. Descartes e outros inúmeros cientistas transformaram a explicação da realidade em uma descoberta, em que razão e método estão associados.

No entanto, no início do século XX inúmeras áreas do conhecimento romperam com o modelo Cartesiano, de que só é possível fazer ciência a partir do que se apresenta de maneira objetiva. O símbolo maior dessa desconstrução é a teoria da relatividade de Albert Einstein em que o tempo não é igual para todos, podendo variar de acordo com a velocidade, a gravidade e o espaço. A equação que representa essa afirmação não resultou da observação, mas da especulação físico-matemática.

Uma revolução para a teoria do conhecimento, em que conhecer deixa de ser descobrir, e passa a ser criar modelos explicativos.

Na esteira dessa transformação, o filósofo matemático Ludwig Wittgenstein escreveu em 1927 “o que se chama descoberta matemática deveria chamar-se invenção matemática” porque a matemática não oferece a verdade, mas apenas fixa o significado de certos signos, pois suas proposições são gramaticais.

O que o século XXI nos ensinará?

 

*Antonio Torres Montenegro é professor Titular do Departamento de História da UFPE. 
Publicado no Jornal do Commercio em 17/02/2018.

 

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