Por Antonio Torres Montenegro

Para muitos de nós o passado histórico se prolonga no presente, porém reformulado. Não seria uma permanência, porque os tempos históricos são outros, as forças sociais se reconfiguram, mas muitas marcas do passado, apesar de modificadas, são reconhecidas no presente.

É esse passado da ditadura militar (1964 – 1985), que alguns idealizam como um período ‘melhor’, que comparo com os relatos de pessoas representativas da sociedade civil.

Inicio pelo bispo de Palmares, D. Acácio Rodrigues, estudado na dissertação “Sob o signo da cruz: presença da Igreja Católica na Mata Sul de Pernambuco – Diocese de Palmares (1962 – 2000)” de Sandro Lemos. Escreveu o bispo: Estes primeiros anos da diocese foram difíceis por causa da efervescência politica. Surgiu, a revolução de 1964. Palmares foi chamada de “Moscouzinho” […] Muitos agentes de pastoral fugiram.[…]Criou-se um clima de tensão entre a Igreja e o Estado. Pediram-me para celebrar uma missa em ação de graças porque tínhamos terminado com o comunismo e não celebrei. A nossa igreja não estava nem do lado do comunismo nem do capitalismo. Foi à época de silêncio na pastoral. Eles queriam restringir o trabalho da Igreja à sacristia. […]

O juiz José Soares em entrevista na Revista de História Oral narra que no final de 1970, ao retornar de Brasília onde acompanhara a votação da Lei Orgânica da Magistratura, fez duras críticas ao governo e o Jornal do Commercio as publicou. No dia seguinte juízes que haviam lido o Jornal comentaram:” “Soares, pelo amor de Deus! Tu és doido? Você quer perder seu cargo? Você vai viver de quê?”

http://revista.historiaoral.org.br/

Aguiar, operário da fábrica da Macaxeira em Recife, rememora o golpe de 1964: “O silêncio! Entrou no coração de todos, fez com que nós ficássemos disfarçados uns aos outros. Procurava os companheiros para conversar e não encontrava[…] Até mesmo os companheiros de partido tiveram medo, não se aproximaram. Fiquei isolado de visita. O caminho que tinha era o da Igreja, onde nos domingos assistia à celebração da missa e recebia aquela comunhão[…] Foi passando para anos o silêncio[…] e tudo na vista da gente tinha desaparecido, as mobilizações, sindicato, não se falava na fábrica ou em parte alguma nesses anos.”

Estes relatos de cidadãos com atividades distintas, apontam para a marca indelével dos regimes ditatoriais, a censura, o cerceamento das liberdades democráticas. Pergunto-me, diuturnamente, se os setores repressivos do estado seriam capazes novamente de calar a sociedade?

 

Prof. Dr. Antonio Torres Montenegro. Professor Titular do Departamento de História 
da UFPE. Publicado no Jornal do Commercio em 28 de abril de 2018.

Comentário

  1. Realmente, a posição da Igreja Católica não é nem o Comunismo, nem o Capitalismo. A Igreja, em si, tem apenas uma Doutrina a seguir. E quanto a isso, defende que o Estado proporcione a cada indíviduo meios suficientes de subsistência. Ou seja, que o Estado permita que o cidadão estude, se alimente, trabalhe, com saúde e tranquilidade.

Deixe um comentário

Please enter your comment!
Please enter your name here