Suas histórias foram silenciadas e processos de apagamentos perpetuaram-se como uma violência à memória de todas as mulheres artistas. Este fato ocorreu não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. A arte produzida por mulheres esteve relegada ao vazio do esquecimento. É um erro que precisa ser corrigido. 

Com essas fraturas na história da arte brasileira, preencher as lacunas é um dever. Esta missão foi empenhada pelo curador Paulo Herkenhoff na exposição “Invenções da mulher moderna, para além de Anita e Tarsila” que fica aberta para visitação até domingo (20) no Instituto Tomie Ohtake em São Paulo (entrada gratuita).

“Aqui, a tese sobre os últimos 120 anos é que a mulher não “contribuiu” para a arte brasileira, porque fez muito mais. Por todo o Brasil, a mulher constituiu a arte como agente de inovação, estando à frente, ao lado, ou mesmo um pouco atrás do homem, mas sempre lá. Essa singularidade política, no entanto, tem seus limites e contradições, pois afinal, quais mulheres puderam ser agentes? No modernismo ocorreram processos de apagamento por motivos regionalistas de busca de supremacia simbólica, preconceitos e racismos diversos. Não havia mulheres negras na arquitetura, na pintura, na crítica – são sintomas de uma crise oculta do próprio lugar das mulheres na sociedade brasileira em termos mais amplos, como a violência sexual, os limites de acesso à educação e a representação política no Congresso”, diz o texto do curador para a mostra.Durante muitos anos os direitos básicos das mulheres foram negados, como o voto e a educação. As mulheres eram consideradas por lei como inferiores. Suas vozes e artes foram silenciadas. Violências reproduzidas em uma sociedade patriarcal, machista, racista, segregadora, que ainda encontram eco nos dias de hoje. E é nessa sociedade que as mulheres resistem.

A mesma resistência de mulheres como Mariana Crioula, que participou ativamente na revolta de escravos organizada por Manuel Congo em 1838, na região de Vassouras no Rio de Janeiro, a mais rica produtora de café no mundo.

Ou Anita Mafalti que sofreu com as críticas machistas de Monteiro Lobato, considerando sua arte inferior, comparou suas obras às imagens produzidas nos manicômios ou por crianças.

São as histórias dessas mulheres que a exposição apresenta, com documentos, esculturas, vídeos, pinturas, roupas, textos.

Os primeiros trabalhos de nus pintados por mulheres. Uma incursão na arte feita na Amazônia. A relação da mulher com a água, com a arte. Esses laços fortes que não se desfazem. Na galeria ao final da matéria é possível ler alguns dos textos que contam estas histórias. Para saber mais sobre a exposição, clique aqui.

A cultura do Muxarabi

“Os artistas viajantes que estiveram no Brasil notaram, sobretudo na Bahia e no Rio de Janeiro, o sistema de arquitetura das janelas em muxarabi. Trata-se de um costume islâmico transplantado para a Península Ibérica e depois para o Brasil colonial: uma seção em grade de madeira nas janelas permite a entrada de ar e luz, mas impede que se veja o interior da casa. As mulheres ficavam por trás dessas janelas e por elas se comunicavam com o mundo exterior, como se vê nessas gravuras de Debret e Theremin. Assim, o muxarabi era um dispositivo da dominação masculina, um símbolo do lugar social das mulheres de classe média e da elite. Para muitas mulheres, dedicar-se à arte como meio de expressão foi uma forma de romper e superar a cultura do muxarabi, libertar o olhar levando o imaginário para além do ambiente doméstico em que estavam confinadas. Realizaram, assim, o desejo de tornar visíveis suas impressões do mundo.” – Texto da exposição. 

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Marianna Marimon, 30, escritora antes de ser jornalista, arrisco palavras, poemas, sentidos, busco histórias que não me pertencem para escrever aquilo que me toca, sem acreditar em deuses, persigo a utopia de amar acima de todas as dores. Formada em jornalismo (UFMT) e pós-graduação em Mídia, Informação e Cultura (USP).

2 Comentários

  1. que interessante essa história da Nair de Teffé, fico imaginando o Rui Barbosa babando ódio e desejos de posse por uma figura tão envolvente, uma bela informação, roteiros de conversas de butecos, ave jornalismo elaborando conversas necessárias!

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