Por Sika Ishizuka

Uma mulher admirável, inteligente e cheia de atitude. Sua presença e trabalho eram tão marcantes, que muitas vezes sua imagem chegou a ser ofuscada pelo marido. Mesmo sendo uma esposa dedicada e apaixonada, foi sistematicamente traída, humilhada e exposta pelo homem amado. Morreu jovem e triste, mas deixou um legado inigualável às futuras gerações.

Esta definição te lembrou a história de Frida Kahlo, mulher símbolo do feminismo na atualidade? Bom, embora as histórias possam ter algumas semelhanças, neste caso estamos falando da Maria Leopoldina da Áustria, a Imperatriz do Consorte do Império do Brasil (1822 e 1826). Mais conhecida como “Maria Leopoldina”.

Nascida como Carolina Josefa Leopoldina de Habsburgo-Lorena, a princesa regente do Brasil teve uma vida marcada por muito sofrimento. Apesar de trazer benefícios diretos à evolução da ciência botânica no país, e principalmente ser um dos principais personagens dos avanços políticos à época, ela sofreu extensas humilhações e até agressões físicas por parte do marido, Dom Pedro I (o famoso macho bosta da relação).

Por isso, decidi reunir cinco motivos para que possamos pensar a ressignificação de Maria Leopoldina como um símbolo da representatividade feminista do nosso país. Apesar de fazer parte da família real (que, na minha opinião, não representa porra nenhuma de nada), há de se reconhecer os benefícios que esta mulher trouxe, que impactaram diretamente as futuras gerações.

Confira:

1 – Praticou a empatia feminina desde pequena

Ao meio, Maria Luisa e Leopoldina. Mais que amigas, friends.

Aos 10 anos de idade, Leopoldina perdeu a mãe e logo ganhou uma madrasta, Maria Luísa. Embora a imagem da nova esposa do pai fosse alimentada negativamente pelos contos dos Irmãos Grimm, esta história em específico, teve uma enteada princesa feliz. O que já quebra com qualquer estereótipo de rivalidade neste sentido.

Em pouco tempo, as duas se aproximaram e se amaram. A madrasta foi uma das principais responsáveis pela educação da pequena Leopoldina. Foi através de estudos rigorosos diários que a futura Imperatriz do Brasil teve acesso a pesquisas multiculturais, tudo no intuito de ser preparada para ocupar o trono. A menina aprendeu a ter apreço pela literatura, música, ciências botânicas, entre outros. Além de ter aprendido seis idiomas diferentes.

E mesmo com uma infância turbulenta, devido às inúmeras guerras provocadas principalmente por Napoleão Bonaparte, a menina teve uma infância bastante proveitosa ao lado da madrasta e também da irmã. Esta que trocou diversas cartas ao longo da vida, as quais contava as impressões do ‘Novo Mundo’, as tratativas políticas e, principalmente, as angústias sofridas no casamento com Pedro de Alcântara.

 2 – Promoveu a evolução da ciência botânica no país

Primeira publicação científica na área botânica do país foi realizada graças ao empenho de Leopoldina

Até a chegada da futura Imperatriz, o Brasil ainda não possuía grandes estudos referentes à botânica e ao minério do país. Desta forma, a nossa jovem Leopoldina entra em cena logo nos preparativos do casamento com Dom Pedro I, quando decidiu trazer uma comitiva de grandes profissionais no navio que embarcava para as terras tupiniquins.

Nesta excursão, havia cientistas e artistas de alta linha da Europa para fazer estudos específicos no Brasil. Desta forma, o país foi o primeiro da América Latina a ser retratado e estudado por estes profissionais que resultou na publicação: Historia Naturales Brasiliae. Mais um ponto positivo para Leopoldina!

3 – Mulher inteligente, que superava expectativas

Casada meses antes de conhecer o marido, ela relatava em cartas o amor que já sentia pelo futuro imperador. No entanto, isso teve um preço.

Apesar das mulheres da corte na época terem fama de fúteis, devido aos grandes privilégios que o império proporcionava, Leopoldina se destacou pelo seu alto grau de inteligência. Logo que chegou ao Brasil, já mostrou a disparidade entre ela e o futuro marido – embora, ainda, que quisessem rebaixa-la pelas aparências.

Isso porque, há relatos de que quando ela desembarcou no país, a corte se espantou pois esperava uma princesa ‘mais magra’. No entanto, reconheciam fortemente o nível elevado da inteligência da moça, que não passava despercebido pela forte presença que tinha. O que, provavelmente, pode ter deixado alguns um tanto ‘intimidados’.

Segundo uma carta do diplomata austríaco Klemens Wenzel von Metternich destinada ao Barão Eschwege, a inteligência e astúcia da nova Imperatriz do Brasil rebaixavam as do marido, Pedro de Alcântara, considerado um ignorante e sem postura.

“Por falar no Príncipe Herdeiro, posto que não seja destituído de inteligência natural, é falho de educação formal. Foi criado entre cavalos, e a princesa cedo ou tarde perceberá que ele não é capaz de coexistir em harmonia. Além disso, a corte do Rio é muito enfadonha e insignificante, comparada com as cortes da Europa”, dizia.

3 – Mulher chefe do Conselho de Estado do Brasil no início do século XIX

Pelo alto conhecimento sobre ciências políticas, se destacou pela tomada de decisões que iam além da criação conservadora que teve na Áustria.

Embora Dom Pedro I tenha a fama de um exemplar governante, a ideia inicial e as tratativas dos grandes feitos partiram de Leopoldina. Reconhecida pela inteligência e profundo conhecimento político, logo ela se encarregou de participar de importantes reuniões ao lado do marido. 

Desta forma, a agora Maria Leopoldina, foi uma das principais articuladoras diplomáticas  do país, o qual abraçou como se fosse nascida e criada. Por este mérito, recebeu o título de chefe do Conselho de Estado do Brasil, o que a tornava uma das representantes mais atuantes do seu tempo, na tomada de decisões que mudaria de vez o futuro do país.

Nos momentos mais conturbados da monarquia portuguesa, Leopoldina fez e aconteceu nas tratativas para a independência do país. E em uma das viagens do marido à São Paulo, a Chefe do Conselho então decidiu que a família imperial ficaria por tempo indeterminado no Brasil, o famoso ‘Dia do Fico’. 

Isso mostrava o empenho e entendimento que a moça tinha pelos anseios do povo brasileiro, que iam além das vontades do marido. A princípio, Pedrinho não mostrava inclinação de dar liberdade à então colônia. Sendo assim, o documento do ‘fico’ assinado pela imperatriz (antes mesmo de Dom Pedro I), ficou para escanteio e o jovem príncipe regente simplesmente se apropriou das decisões da mulher, dias depois.

E mesmo que haja controvérsias em relação à representatividade da família real, é notório o empenho por parte de Leopoldina. Isso porque a princesa tinha clareza que manter o país como colônia já não fazia parte do progresso de nenhuma gestão. E, mesmo não tendo os ouvidos diretos de Pedro, encontrava meios para que ele pudesse seguir suas orientações. Como falar com outros representantes homens, para dar mais ênfase ao seu ponto de vista.

E uma de suas principais frentes, foi manter a unidade brasileira e não ter o país dividido em diversas repúblicas – uma vez que algumas regiões entravam em conflito pela independência da monarquia. Foi aí que Leopoldina tomou frente, enviou uma carta ao marido, e deu uma forte advertência para que ele proclamasse o feito no Brasil. A mensagem chegou no dia 7 de setembro de 1922, tendo efeito imediato pois resultou no famoso grito ‘Independência ou morte’ de Dom Pedro.

5 – Mesmo foda, traída e humilhada

Maria Leopoldina

Apesar do fundamental apoio das tratativas políticas, além de ajudar a expandir o conhecimento científico no Brasil, Leopoldina recebia em troca socos e humilhações por parte do marido. Talvez o fato de ser extremamente comunicativa e com inteligência acima da média, intimidou o homem que foi criado sem maiores estudos e em meio aos cavalos.

Em resposta, Pedro traía sistematicamente a companheira, sem se importar com o falatório da população. O que a rebaixava ao título de ‘esposa traída’, mesmo que todos respeitassem sua imagem como representante da monarquia. Dentre os inúmeros casos do marido, está Domitila – a futura Marquesa de Santos.

Neste, que se tornou um escândalo extraconjugal, Pedro fez questão de expor a esposa com: reconhecimento da filha que teve com a amante; nomeação de Domitila como acompanhante da imperatriz; viagem imperial à Bahia juntamente com Domitila; entre outros casos absurdos que humilhavam profundamente Leopoldina, o que gerou uma forte depressão na nossa Imperatriz.

Já com sete filhos e com a vida abalada, Leopoldina morreu aos 29 anos de idade. Há relatos que a causa da morte da Imperatriz se deu após agressões (com direitos a xingamentos e pontapés) desferidas por Pedro, o que a fez rolar escada abaixo. Isso porque ela se negou a participar de uma cerimônia oficial ao lado da amante do marido.

E, diante das conquistas e avanços, lincados com os inúmeros desagrados, Leopoldina conquistou o coração dos brasileiros – que a admiravam até mais que o próprio Imperador do Consorte. Mesmo vindo de outro continente, soube abraçar nossa terra como ninguém. Teve uma morte prematura, porém uma vida gloriosa. De uma mulher que enfrentou as adversidades da época através da inteligência e representatividade. Que mulher!

E aí, será que não está na hora de repensarmos este título a ela? Veremos!

Fonte: REZZUTTI, Paulo (2017), D. Leopoldina: a história não contada: A mulher que arquitetou a independência do Brasil

Sika é jornalista e curiosa nata, por gostar bastante de história.

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