Por Rodrigo Brito

O ano de 2013 foi de experimentos na escrita para mim. Escrevia com muita frequência artigos para um jornal de Rondonópolis e, na época, produzi um texto sobre o cemitério da Vila Aurora. A ideia foi refletir sobre a arte e cultura no local e estabelecer algumas questões a respeito do tema que nos causa tanto desassossego. A partir da vivência de ir ao cemitério para escrever um artigo, tornei-me curioso por saber mais sobre as necrópoles no Brasil.

Foi quando, em 2015, o site Carta Capital publicou a reportagem “Ao pó voltarás”, apresentando o trabalho de visitas ao cemitério como opção de roteiro cultural e, ainda descobri uma pessoa que, assim como eu, acredita que o silêncio dos cemitérios tem muito a dizer. Comecei então a acompanhar via Facebook, os trabalhos de Clarissa Grassi em realizar visitas ao Cemitério Municipal São Francisco de Paula, em parceria com a Secretaria do Meio Ambiente e a Fundação Cultural de Curitiba, Paraná.

Divulgação Prefeitura de Curitiba
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Ainda não tive a alegria de participar desse roteiro cultural, porém, admiro os trabalhos de Clarissa tanto em promover a interação dos sujeitos com os cemitérios como em suas atividades intelectuais de refletir as artes tumulares. Muita vida pulsa nos túmulos, nas flores e nas esculturas; a necrópole é o espaço dos afetos. Quando leio os textos dela ou vejo as imagens das visitas, tenho certeza que a afetividade está presente e é determinante nas homenagens.

Meus comentários, então, são de leitor, de alguém que mora no Mato Grosso e deseja muito participar das visitações. Ao refletir que existem vida e sinceridade nos passeios, o meu papel de entusiasta, admirador e curioso me movimentam para pesquisar e escrever sobre o trabalho dela.

Divulgação Prefeitura de Curitiba
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O objetivo das visitas, segundo as informações na obra Guia de Visitação ao Cemitério Municipal São Francisco de Paula (2014), é resgatar as trajetórias e memórias de personalidades enterradas, possibilitando aos visitantes informações sobre as biografias, arquiteturas, geologias e simbologias nos túmulos. Destaco que os trabalhos da pesquisadora resultam em um olhar multidisciplinar, o que evidencia as potencialidades do cemitério, considerado como um patrimônio histórico, artístico e cultural de Curitiba.

O cemitério foi fundado no dia 1º de dezembro de 1854 na capital do Paraná e reúne, conforme as informações no livro mencionado, “um vasto acervo de esculturas e manifestações artísticas, abriga marcas e indícios da história da sociedade, política e economia paranaenses. Mais que ornamentação de túmulos, suas obras traduzem a evolução histórica de Curitiba, assim como simbolizam a visão de nossa população acerca da morte, revelada por meio da arte tumular”.

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Divulgação Prefeitura de Curitiba

A escritora reforça a importância de compreender os cemitérios como uma organização que obedece aos mesmos critérios de hierarquização do espaço nas cidades. Dessa maneira, Clarissa afirma que os cemitérios são feitos sobretudo para os vivos, pois espelham a cidade que os produziu. Referenciando Phillipe Ariès (1914-1984), a pesquisadora problematiza que as necrópoles reproduzem em sua topografia a sociedade global, reunindo a todos em um mesmo recinto.

No dia 11 de março, a visita foi exclusivamente dedicada ao dia internacional das mulheres. Essa foi a primeira visita com projeto temático e teve como escopo homenagear as personalidades femininas. Trata-se de uma conquista, uma forma de aumentar a visibilidade das mulheres sepultadas e ressignificar a história de Curitiba. Membro da Fundação Cultural de Curitiba, Clarissa informa que as visitas acontecerão duas vezes ao mês, divididas em visita normal e visita temática – ligada a uma data comemorativa do mês.

Divulgação Prefeitura de Curitiba
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Esse trabalho de incentivar um olhar cultural e histórico sobre a necrópole é importante para compreender algumas questões que envolvem a sociedade. Diante de várias notícias de cemitérios desprezados pelo poder público, Clarissa inova ao levar as pessoas para o local. A compreensão de que o espaço produz subjetividades e constrói narrativas, pode ser um passo para um diálogo sensível e, ao mesmo tempo, fortalecido para lidar com os sofrimentos.

Divulgação Prefeitura de Curitiba
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Por meio de leituras e acesso à rede social, tenho acompanhado as informações sobre as visitações. As reflexões que podem ser desdobradas a partir do contato com o espaço público são inúmeras, mesmo que eu não tenha vivenciado o roteiro cultural. Há ainda muito a ser dito sobre o tema, mas, no momento, apenas posso avisar que as visitas são no período matutino, das 9 às 12 horas e que, para participar, é necessário informar o nome completo e o número da carteira de identidade por e-mail visitaguiada@smma.curitiba.pr.gov.br.

Rodrigo Brito é poeta, autor de Solstício ao Luar (2013) e VISÕES (2015). 

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