Por Isabela Bonilha*

Há algumas semanas, o delicado tema do suicídio circula as redes sociais e rodas de conversa entre jovens e adultos, bem como ronda com insistência as mentes de pessoas que, como eu, sofrem de distúrbios psicológicos. Primeiro, a série Thirteen Reasons Why, causou polvorosa e dividiu os jovens em dois grupos: aqueles que se identificaram com Hannah Becker e aqueles que acreditaram que a moça foi dramática demais. Agora, a notícia de que o jogo/desafio (sei lá como você queira chamar), Baleia Azul matou um jovem em Mato Grosso, traz à tona novamente o assunto que mal tinha morrido. Não, eu não sou psicóloga/psiquiatra/estudiosa ou especialista formada no assunto. Minha especialização veio de uma instituição chamada vida. A vida com depressão e ansiedade, que levo desde a mais tenra idade.

c78b06cb900744b3120d9a9e2443be63Uma vez, quando eu tinha cerca de 4 anos de idade, ao entardecer, senti uma coisa horrorosa no peito e resolvi ir até a minha mãe, que estava à beira do fogão fazendo comida pra mim. Criança franzina e encolhida que eu era, me encolhi toda no espaço entre o fogão e a parede e choramingando reclamei: “Mãe, eu tô com uma vontade de chorar, um aperto aqui, mas não sei o que é”. Minha mãe, sábia e sempre muito direta, respondeu: “O nome disso é angústia, minha filha”. Ali, eu descobri o nome de um sentimento que me atormentaria por longos dias no decorrer de toda a minha vida até agora. Era tímida, medrosa, tinha medo da morte, fazia perguntas de encabular qualquer adulto, desde muito cedo. Não queria ir pra escola. Antes das provas e aulas de natação, eu tinha dor de barriga. Frequentei uma psicóloga que me fazia brincar com o Wally, e eu não entendia bem o que estava fazendo lá.

Adolescente, fui uma menina dada a gostos sombrios e deprimentes. Ouvia Legião Urbana sem parar, apreciava filmes dramáticos, lia livros pesadíssimos de autores que a maioria das pessoas só vai ler na vida adulta e olhe lá. Nutri, por muito tempo, sentimentos mórbidos que hoje em dia evito alimentar. Mais ou menos nessa época, tive minhas primeiras crises de pânico. Que eram encaradas como algo que eu havia comido, um ataque de hipoglicemia que me fizera tremer até não aguentar mais. Coisas assim.

No fim da faculdade, tomei, em uma cerimônia religiosa, um chá de Ayuashca, (ou o famoso Santo Daime, como vocês devem conhecer), que potencializou meus até então “pequenos” problemas psicológicos e o resultado foi um ano de depressão profunda, no qual eu mal conseguia sair ou conversar com meus amigos. POR QUE? As pessoas me perguntavam. POR QUE VOCÊ ESTÁ ASSIM? E a minha maior angústia era não saber responder. Graças à Deus, tenho uma família maravilhosa e esclarecida, que me apoiou, que me ajudou a procurar terapia, que tentava conversar comigo diariamente. Uma mãe e uma irmã que me punham no colo e escutavam todas as minhas lágrimas-sem-porquê até que enfim secassem. Foi difícil, pra dizer o mínimo. E cheguei a pensar naquela palavrinha que eu disse lá no comecinho do texto, essa mesma, que a gente morre de medo de falar: suicídio.

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Ouvi-la tanto, nas últimas semanas, tem disparado em mim diversos gatilhos de ansiedade, e creio que em muitas outras pessoas que sofrem de problemas psicológicos também. Ter que ouvir e ler pessoas dizendo coisas como “é frescura”, “é pra chamar atenção”, “é burrice”, “o que dá na cabeça de uma pessoa dessas?”, me faz reviver minha adolescência e parte da vida adulta, quando eu tinha vergonha de assumir minha doença e medo que as pessoas se afastassem de mim por causa dela. Um medo que às vezes volta a bater na porta do porão em que o tranquei. São atitudes e palavras preconceituosas como essas que fazem com que pessoas que sofrem em silêncio de transtornos como depressão, síndrome do pânico, bipolaridade, ansiedade generalizada, escondam-se em seu mundo preto e branco e não procurem ajuda. Como qualquer outro preconceito, ESTE TAMBÉM MATA. E se não mata de vez, mata aos pouquinhos, pessoas que morrem um pouquinho a cada dia, por resistirem em se cuidar, conversar com familiares, procurar tratamento.

A vocês, que tem a mania de gritar aos quatro ventos por aí frases como as escritas acima, ou ainda outras como:

“Isso é falta de cinto!”

“Psicólogo pra que? Pode conversar comigo, eu não vou cobrar nada! Kkk”

“Psiquiatra é coisa de louco!”

“Vai tomar remédio? Cuidado! Isso vicia!”

“Acho que você não precisa de médico, apenas tente mais um pouco!”

“Deixa de ser dramático!”

CUIDADO! Nós nunca sabemos se as pessoas que nos cercam estão passando por dificuldades, estão sofrendo em silêncio, estão envergonhadas ou com medo, justamente por causa de palavras como essas. Precisei de muito divã e apoio pra entender que meu tratamento não era uma frescura, que tomar remédios pra regular a minha química cerebral, não era uma fraqueza, que, muito pelo contrário, me tratar é sinal de força, ainda mais num mundo tão preconceituoso, que tende a achar que todos sentem o mundo da mesma forma. Sinto muito, mundo, MAS EU SINTO MUITO. E não é drama, nem frescura.

Minha vida não foi toda uma infelicidade, é CLARO! Essa é apenas uma dificuldade que tenho que vencer com frequência, um leão que tenho que matar diariamente, e fui abençoada com muitas mãos e espadas pra me ajudar. Agradeço a Deus por isso. Mas e você? Vai escolher ajudar a quem? Àquela pessoa que precisa de apoio, carinho, compreensão, respeito, ou ao leão? Pense nisso.

E a quem se identificou com alguns dos sentimentos expressados aqui: PROCURE AJUDA. CONVERSE COM ALGUÉM. MANDE UMA CARTA. LIGUE PRA MIM, SE PRECISO FOR. E saiba que a prioridade é você. Louco é quem vive nesse mundo confuso, dizendo coisas maldosas, e achando que é são.

Telefone do CVV (Centro de Valorização da Vida): 141

Site do CVV: http://www.cvv.org.br/ (Aqui tem também chat e Skype, pra quem não gosta muito de falar pelo telefone).

Busque ajuda, VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO!

*Isabela Bonilha - Formada em Letras Português e Literatura pela UFMT, professora, 
escreve desde os oito anos. Tem um blog que nutre desde os 13: Um Vagabundo e 
as Estrelas. Apaixonada por arte, gosta de pintar, costurar, customizar e 
alterar coisas ao redor, mas se encontra mesmo na escrita. Escreve para espantar 
os fantasmas da Depressão que vem desde a infância. Seu cenário é o Cerrado e a 
cidadinha de Guiratinga, na qual nasceu e foi criada.

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