Por Fábio Guimarães*

Na segunda passada, numa manhã igual à de hoje, estava já internado à espera de cirurgia, em uma sala abarrotada de olhares ansiosos. E era um entra e sai sem parar – um caos ordenado… Tal uma feira livre. Antes, porém, entregaram-me uma quase sapatilha; uma touca horrorosa e um camisolão de dar dó – conta de seu aspecto cômico. Sabia ser a sala anterior ao Centro Cirúrgico. Então, devidamente trajado para o procedimento carregado daquela famosa frase “Toda cirurgia envolve um risco (de morte é claro). Pode ocorrer tudo como previsto ou é possível que você saia direto para a funerária”. É interessante a reação de cada um. Aquela mulher – uma paciente – falava sem parar com uma paciente enfermeira. No outro canto um individuo roía as unhas. Fui colocado em uma maca confortável que me levaria à famosa sala! Ao lado o seu Joaquim. – Vejo que você é novato em cirurgias – disse-me sorrindo. – Sim. Consegui articular a afirmação. – É a quinta que faço – retornou o Joaquim. – Quinta! – exclamei. – Retirei a vesícula; o apêndice; uma hérnia inguinal; uma úlcera estomacal perfurada e, agora, uma porção de divertículos inflamados – enumerou-me, com um ar de superioridade, o Senhor Joaquim. – O Senhor está escolado – retruquei. Ele concordou movimentando a cabeça. Logo em seguida ao breve diálogo veio o chamado: “Senhor Joaquim”. E lá se foi o Joaquim com um pálido meio riso no rosto visivelmente apavorado. Confesso que tive inveja dele. “Por que não quebrei nada antes?”. Se ele, useiro e vezeiro em operações, saiu com ar de cadáver, como procederei eu, neófito nessa prática tenebrosa? E chegava a dona Maria, meio viva, meio morta. Eu, com a camisola ridícula, quieto esperando o chamado quase fúnebre…
Creio que, antes de minha vez, foram e chegou do Centro Cirúrgico, uma dúzia de pessoas anônimas – éramos robusta coleção de receios e agonia que não se declarava. (Nem carecia…). Súbito a voz anuncia: “Senhor Fábio!”. E veio uma enfermeira risonha, “Vamos nós!”. Não achei a mínima graça. Depois, já no local do matadouro, escutei a simpática anestesista dizer: “Estamos a lhe aplicar um remedinho para dormir…”. E não ouvi mais nada! Acordei, vivo, na sala de recuperação: lotada de sobreviventes!…


*Fábio Guimarães é poeta, escritor, professor e defensor público de Mato Grosso.

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