Já é de manhã. 9h30. Abro os olhos, espreguiço na cama e me levanto. Ouvi dizer que é bom pra não deixar os músculos tensos. Ligo a tv e abro o pc. Celular na mão. Esses dias minha avó perguntou “você tá com o computador aberto e o celular na mão?”, e aquela cara de espanto que ainda tá fresca aqui na minha mente. É, vó, o mundo de hoje é assim. Celular na mão, cabeça a mil por hora, tv e computador conectados em você. Daqui a pouco nem dos aparelhos vamos precisar mais. Tipo aquele episódio de Black Mirror que a galera consegue ver toda memória nos olhos e até projeta pros outros assistirem. É, assim mesmo. É tudo conectado e nem precisamos de cabos pra isso mais. Ouço as notícias: mais uma bala perdida em algum bairro da periferia, mais um negro assassinado, mais um pobre injustiçado, uma mina foi estuprada, será que eram da família? Somos todos da mesma família, somos todos seres humanos, todos de carne, osso, veias e sangue. Ninguém aqui tem sangue azul e se tivesse, que estranho seria, não? O mundo tá um lugar bizarro, talvez sempre tenha sido e a gente que não tinha tanto espaço aberto pra se expressar. “Lavar os copos, contar os corpos e sorrir a essa morna rebeldia”, como diz Criolo. Hoje a gente vive entre o amor e o ódio. Você escolhe o seu lugar à mesa. Quem você quer ser? Onde quer se sentar? Qual prato você vai usar? Que roupa vai vestir? Você vai trabalhar assim? Credo! Prende esse cabelo, solta esse cabelo, tira esse brinco, coloca esse aqui óh, toma esse colar, vai ficar legal em você com essa roupa, tira esse alargador, tira esse piercing, pra que essa tatuagem? Dá pra tampar com um pouquinho de maquiagem, te empresto vem cá. Você não usa sutiã nunca? Credo! Os homens vão ficar olhando seus mamilos, dá pra ver certinho nessa blusa. Você vai de chinelo? Credo! Ah, é Havaianas? Ok, na Europa custa uma fortuna. Aqui no Brasil também tá uma fortuna, meu caro. Ontem uma amiga veio aqui e falou que a mensalidade da escola da filha dela – ensino regular, nem é período integral – está custando pra mais de mil conto. Eu não sei onde o mundo quer chegar com esse mundo.

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Economista, realizadora audiovisual, produtora e ativista cultural. A arte é intrínseca aos seus múltiplos olhares.

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