Por Monique Esposito*

Com a modernidade, muitos hábitos e costumes da sociedade mudaram ou foram esquecidos devido à tecnologia, que se tornou mais presente nas últimas décadas, sobretudo no século XXI. Apesar da carroça de ter sido usada por um longo tempo como transporte pelas pessoas em lutas de gladiadores, na zona rural ou até mesmo nos contos de fadas, que eternizaram o “veículo” de abóbora de Cinderela, esse meio de locomoção ao que tudo indica está com os dias contados.

Desde o aumento na produção de veículos automotores, seja para o transporte de mercadorias ou de pessoas, aumentou, o que facilitou a mobilidade, desvalorizando o meio de tração animal. O carroceiro Arlindo Rosa Xavier, 64, nascido em Santa Rita do Araguaia, Goiás, de uma família humilde, desde cedo começou a trabalhar na lavoura para ajudar em casa. Casou-se aos 23 anos. De sua união com a esposa nasceram cinco filhos, sendo três homens e duas mulheres. Eles tiveram seis netos, que são os amores de sua vida.

Há cerca de 32 anos ele iniciou na profissão de carroceiro, após também trabalhar de vigilante e logo mais de comerciante. A escolha veio devido ao auge que a carroça vivia por volta dos anos 1985. Nessa época em Alto Araguaia o serviço de tração animal era muito solicitado, para fazer fretes e transportar pessoas – o táxi de antigamente.

Seu Arlindo – Foto Monique Esposito

Hoje a profissão de carroceiro está ultrapassada e os fretes praticamente desapareceram. Mesmo com as dificuldades, seu Arlindo não desiste e todos os dias sai de casa, na rua Jerônimo Samita Maia, no Centro de Alto Araguaia, e segue em direção ao pasto no bairro Gabiroba, onde deixa o seu cavalo, Pretinho, sempre com a esperança de conseguir algum serviço, o que muitas vezes não acontece.

Seu Arlindo trabalha no Ponto dos Carroceiros, na rua Antônio Alves Favero, Centro. O ponto leva o nome de José Loura de Brito (Cazuza), uma homenagem ao antigo carroceiro, já falecido. Antigamente, o local era situado na avenida Carlos Hugueney, em frente ao Banco do Brasil.

Foto Monique Esposito

Confira a entrevista com o carroceiro que ama sua profissão:

Monique Esposito: Senhor Arlindo, quais foram os motivos que o levaram a escolher a profissão de carroceiro?

Arlindo Rosa Xavier: Olha, vou ser sincero, na época que iniciei na profissão era muito bom, porque tinha muito serviço na cidade, as pessoas procuravam pelo veículo de tração animal para levar uma mudança pequena, materiais de construção e outros objetos, que davam para ser levados na carroça.

ME: O senhor me disse que iniciou na profissão nos anos 80. Quantos carroceiros trabalhavam naquela época?

ARX: Quando eu comecei éramos em muitos, não lembro mais o número exato de carroceiros, mas aproximadamente tinha uns 13 ou mais companheiros de trabalho, e tinha frete para todos, ninguém ia para casa sem fazer um frete no dia.

Foto Monique Esposito

ME: Hoje, com o avanço da tecnologia e a crescente indústria locomotiva, como está a situação da profissão em Alto Araguaia?

ARX: A pior possível! Eu não tenho esperanças que as coisas irão mudar e a profissão será valorizada novamente, eu acredito que não terá mais carroceiros depois que eu e meus colegas encerrarmos a nossa carreira (risos resignados).

ME: E com a baixa demanda, quantos carroceiros ainda resistem na profissão na cidade?

ARX: Somos em três atualmente, meu irmão Manoel, eu e um parceiro.

ME: Mesmo com pouco trabalho, o senhor segue na profissão de carroceiro. Por qual motivo?

ARX: Eu ainda continuo porque não tenho mais saúde para enfrentar outro serviço. Com o passar dos anos e a chegada da velhice, eu desenvolvi uma doença no pulmão, às vezes, quando me esforço muito, sinto muita falta de ar, mas eu não sou feliz com isso… Eu quero é trabalhar e poder viver dignamente. O que me faz seguir é a minha fé em Deus. Todos os dias eu agradeço por mais que eu esteja passando por dificuldades. Ele sempre está comigo, me deu uma família maravilhosa, meus filhos e netos. O amor que eu sinto por eles dinheiro nenhum compra.

ME: Além desse trabalho, o senhor tem alguma outra fonte de renda?

ARX: Faço parte do programa da prefeitura “Feijão no Fogo”. Isso que eu tenho a maior parte do mês porque aqui com as carroças eu tiro em média de 150 a 200 reais por mês, é muito pouco.

De todas as profissões que eu já tive, a única que eu gostei de verdade foi essa. Eu conheci muita gente, criei minha família com o dinheiro da carroça.

ME: O senhor já tem 64 anos, sendo mais de 30 anos de profissão, e problemas de saúde. Por que ainda não se aposentou?

ARX: Estou na luta para conseguir me aposentar. Já tem mais de três anos, mas faço a perícia e não consigo passar. Acho que eles estão esperando eu morrer para me darem a aposentadoria.

ME: O governo federal quer aprovar a Reforma da Previdência, aumentando a idade para se aposentar e o tempo de contribuição de imposto. Qual sua visão sobre esse assunto?

ARX: Já fui atrás para saber mais e me disseram que como eu já havia entrado com o processo não faço parte da nova regra, apesar de achar que esse governo quer que todo mundo trabalhe até o dia de morrer para não precisar pagar a aposentadoria. Eu fico revoltado com a forma que esse governo está conduzindo as coisas, o Brasil está num beco sem saída (risos).

ME: Um desejo que o senhor tem para sua vida?

ARX: Sou um pai coruja… e eu queria ter todos os meus filhos e netos do meu lado, pois não tem nada melhor pra mim que ter a família reunida, mas eu sei que cada um tem que seguir o seu caminho, ter sua vida, e agradeço a Deus por todos serem honestos.

ME: Que frase o senhor leva consigo e que pode dividir conosco?

ARX: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará” (Salmo 23, versículo 1). Essa frase é conhecida, mas é isso que cada ser humano tem que ter em mente, porque Deus não faz nada de ruim pra gente, nós é que falhamos e depois temos que responder pelos nossos atos. Não é castigo de Deus, como muitos falam (risos).

ME: Que outra profissão teria seguido, se não fosse carroceiro?

ARX: Nenhuma, sabe por quê? De todas as profissões que eu já tive, a única que eu gostei de verdade foi essa. Eu conheci muita gente, criei minha família com o dinheiro da carroça. Hoje não consigo sobreviver muito bem sendo carroceiro, só que fui muito feliz aqui, mesmo sabendo que o futuro da profissão é chegar ao fim.

ME: Se Deus lhe desse o direito de fazer um único pedido, o que o senhor pediria?

ARX: Saúde, somente isso. Não precisamos de nada além de saúde. Eu penso assim. Às vezes um milionário tem tanto dinheiro e não tem amigos, e isso graças a Deus eu tenho. Ou uma pessoa tem dinheiro para comer e está doente e não consegue comer… Então o que mais eu vou querer pra minha vida a não ser saúde?

*** Se é que ainda posso fazer um acréscimo, como repórter gostaria de dizer que seu Arlindo é um brasileiro nato, cheio de esperança e fé por dias melhores. Mesmo diante das dificuldades que enfrenta todos os dias, ele não desiste de lutar. Espera, assim como muitos, o dia em que a justiça chegue até seus cidadãos brasileiros que tanto trabalham e resistem ao tempo e às controvérsias que nosso país vivencia.

*Monique R. Esposito de Souza, 21 anos,  nascida em uma pequena cidade ao norte de 
Mato Grosso que leva o nome de Brasnorte. Desde criança, sou esperta e destemida, 
só não quando se trata de escuridão. Meus planos sempre foram não ter planos, mas, 
sim, objetivos. Viajar pelo mundo afora se tornou um sonho. O curso de Jornalismo 
(da Unemat de Alto Araguaia) tem proporcionado grandes possibilidades, como viajar. 

2 Comentários

  1. Boa visão e a entrevista da Monique Esposito, simples, objetivo, espontâneo, cativante do carroceiro Arlindo, que será “eternizado” na memória do povo local e do arquivo Cidadão Cultural sobre a obsoleta profissão de Carroceiro, deixando postado a UBER, tecnologia que domina o mundo. Parabéns Monique e ao Sr. Arlindo.👏DEUS os abençoem!

Deixe um comentário

Please enter your comment!
Please enter your name here