Tem artista que vence pelo esforço. Uma tremenda luta para superar desconfianças e eliminar preconceitos. Vence na raça, trabalhando muito. Alex Teixeira é um desses. O cara é a maior fera, toca uma bateria muito acima da média. Sofisticada e experimental, livre para transitar entre ritmos e escolas. Nada parece impossível. Ele gosta dos desafios e encara as tarefas com uma crença inabalável. Voz suave, jeito manso, ele é leve e fala com certa timidez. Mas é professor, músico de palco, de estúdio. É músico por que tinha que ser músico, ou melhor, um dia viu o irmão no palco e quis se tornar músico também. Influência de irmão mais velho. Irmão que tanto admirava e que não acreditava nele: você nunca vai conseguir ser músico guri, vai tentar outra coisa! Ele conseguiu e muito bem. Afirma em alto e bom som: sou filho de faxineira, tenho muito orgulho de minha mãe e estou vencendo o jogo pelo meu próprio esforço.

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Foto: Acervo Pessoal (Facebook)

A primeira e única vez que vi o Alex Teixeira tocar foi em um concerto da Orquestra Contemporânea de Percussão na Universidade Federal de Mato Grosso e fiquei bastante surpreso com o rigor dos percussionistas que executavam peças dificílimas. Inclusive composições dele. Umas três ou quatro músicas regidas pelo maestro Roberto Victorio, que desvendou esse novo mundo contemporâneo para Alex. Outro tipo de composição, outras maneiras de tocar percussão abrindo um vasto mundo livre para surfar. Criações que estão muito à frente numa perspectiva da história da música, a ponta da lança, num vasto campo aberto para a elaboração de novos conceitos composicionais. Não há limites para isso, é como em qualquer campo da linguagem e da criação artística. Os conceitos são dinâmicos e atemporais. São muitas as formas, plataformas, meios de criação, tecnologias diferentes, outros tempos, tudo é fragmentário e veloz. Daí, a cabeça do rapaz explodiu como estrela, iluminou novos sentidos.

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Foto: Acervo Pessoal (Facebook)

Ele que vem de uma formação conservadora, que começou a tocar na Igreja, na banda municipal de Várzea Grande, de repente vê o mundo com outros olhos, expande a mente, as possibilidades milionárias de criar em consonância com o desejo de experimentar, ampliar a percepção pela música. Não que não haja música boa em outros tempos. Tem música que atravessa tempos, mas as coisas não param por aí. Há que avançar, as criações contemporâneas abrem para novos conceitos, para outras formas de perceber a música, como um desejo permanente de expansão dos sentidos, da filosofia, das novas relações sociais amparadas por novas tecnologias, da nossa impossibilidade de preenchimento. E isso não acaba nunca. Quem fica parado é poste. Há que atualizar e avançar. Amanhã seremos outros.

Alex Teixeira produziu um disco Ganzá-Mocho nos Tambores: Calendário do Som, Músicas de Hermeto Pascoal onde, além de interpretar músicas de Hermeto, homenageia, personalidades da música e da arte popular cuiabana com suas datas de aniversário como títulos das músicas. Então temos referências a Zulmira Canavarros, Mestre Albertino, Dunga Rodrigues, Bolinha, Liu Arruda, China e outros. Alex é devoto da cultura mato-grossense.

Foto: Acervo Pessoal (Facebook)
Foto: Acervo Pessoal (Facebook)

Ganzá-mocho nos tambores é um CD de alto nível musical. As atuações dos músicos que convidou para essa aventura nos convencem de que estamos ouvindo música de alta performance, não é fácil executar peças de Hermeto Pascoal. Com Alex, na bateria, mocho e ganzá, comandando a trupe, acompanhado de Sydnei Duarte na guitarra, Bruno Rejan no baixo, piano com Igor Mariano e Diones Correntino, o genial menino Phellipe Sabo nos instrumentos de sopro, Raul Fortes na cuíca, Neto Morais no sax tenor e Augusto César sax alto, fizeram um disco emblemático, que nos transporta para outras geografias. Ao utilizar elementos típicos do siriri e cururu, que deixaram esse paulista do interior fascinado pelas suas possibilidades sonoras, ele supera visões meramente folcloristas e explora os instrumentos com suas potencialidades rítmicas e timbrísticas, dentro de um contexto sonoro aberto e universal.

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Foto: Acervo Pessoal (Facebook)

Voltando ao nosso personagem principal, o primeiro professor de música também sugeriu que Alex jamais conseguiria se tornar um instrumentista qualificado. Mas ele comprou a briga e foi à luta, estudou muito, se entregou de corpo e alma para esse que era seu projeto de vida: se tornar músico. Ouvi com curiosidade aguçada, a fala de um colega do Alex, do curso de música na UFMT, o João Azevedo, que desistiu de continuar e hoje é técnico de som, ele dizia que, enquanto todos estavam ali cochilando, descansando entre uma aula e outra, lá estava Alex tocando sem parar, com garra, repetindo sem parar as músicas até pegar o jeito, até soltar a alma que rege toda música. Encontrou o que precisava e hoje perfaz um caminho que não tem mais volta, enfim, ele conseguiu, é um grande músico, tem uma sensibilidade extraordinária e muito conhecimento. Não disfarça, fala com propriedade sobre diversos assuntos que conversamos, conhece a história da música sabe onde está pisando, conhece o percurso histórico dos instrumentos que manipula, investiga, cria, recria e consegue extrair sons incríveis.

Sua veia é jazzística, gosta de improvisar, gosta de soltar as amarras da música padronizada e deixar fluir para aventuras entre o improviso e a maestria no domínio da música com todo o requinte e sentimento. Não há música sem sentimento. Não há razão que explique um ponto de fuga quando você mergulha nas profundidades. Quando surfa nessa onda que se espalha pela infinidade dos espaços possíveis.

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