*Por alam borges

sentia-se confiante. caminhava pelos imensos rios do shopping de cabeça erguida e até ousou parar diante da vitrine sem nem arreparar no que estava à vista: com desconto ou a prazo em até 12x sem juros no cartão; e ele la usava cartão que nada! ia pagar era à vista; parou na frente da vitrine e reteve os olhos no vidro como espelho e olhou foi a si mesmo no débil reflexo de um ectoplasma arranjando os cabelos, ou melhor, o imenso topete que não cabia dentro do quadro. ajeitou com as duas mãos o topete e abriu um sorriso confiante. quando alcançou a esposa ela lhe perguntou: “quê qui ce tava olhano?” ele nem respondeu; confiante ergueu o topete que morava caído que nem crista de galo. ia sempre ao shopping de rolê com os guris e a mulher. mas hoje era um dia especial, pois ia comprar a tão sonhada televisão de 40 polegadas. sentia-se confiante. o shopping lhe pertencia como a qualquer outro. sentia-se importante e participante da tal sociedade, também podia comprar, e no dinheiro! so agora descobria-se parente distante desta fraternidade. desinibido parou diante da vidraça de uma loja fechada e escura, e narciso surgiu-lhe, então, claro a sua frente arranjando novamente o topete: puxou a gola da camisa e abotoou mais uma casa; puxou as calças ajeitando para dentro a camisa; virou-se, e, dobrando o pescoço para tras, ajeita o traseiro. caminha confiante de cabeça alta e até ousa lançar de relance olhares às linda mulheres que por ele passam. quando alcançou a esposa, ela lhe passou um pito: “que diacho de tanto rococó é esse, na frente do espelho?” para tornar a compra mais em-conta, além do desconto ganho, ombrou a televisão e, a esposa, depois de tantas postagens, postou: “#partiupontodeonibustv40polegadaaaaas”. o ônibus mal parou e os guris subiram correndo pela porta do meio para assegurar assentos. a mãe subiu primeiro e ficou segurando nos degraus a televisão com uma mão, enquanto vasculhava com a outra o celular. o marido, antes de subir, olha no vidro da janela do ônibus o topete especado por um sorriso confiante; e, pisa o primeiro degrau, o motorista arranca num solavanco. a televisão lhe escapuliu da mão e desceu, caindo atrás de seu marido que ficara no arranque. as rodas esmagaram a televisão; de donde, de algum filme trágico escorria pela sarjeta um sangue espesso coagulando o sol.

*Alan Cardec Borges nasceu em Torixoréu/MT e mora em Cuiabá desde 1993. 
Autor de: Alegorias encantadas :crianças, (contos infantojuvenis) 
fogo (poema) e o infiltrado (poema). assina seus livros como alam borges. 
Este conto faz parte do livro: shopping.

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