Passeio com o cão no meio da tarde. Faz um clima ameno. Nuvens desenham figuras no céu e uma brisa leve sopra nas folhas da sete copas. Na calma daquele momento percorro o olhar sobre as fachadas das casas vizinhas que me cercam. Percebo que uma delas recebeu pintura nova. Suas paredes restauradas destacam-se em comparação às outras, evidenciando nestas o passar do tempo que imprime sua marca sobre tudo. Nessa pátina acinzentada e suja revelam-se mundos microscópicos ao rés do chão. Pequenas frestas e rachaduras se abrem sobre a superfície entre musgos e micro samambaias.
Penso no tempo necessário para que o líquen da parede se transforme numa camada aderente e óbvia. Para que a pintura descasque deixando à mostra a cor existente por baixo, de pinturas passadas, antigas, esquecidas até que nos lembremos ao vê-las.
No sujo cinza do muro dançam imagens num balé infinito.
Paro diante da minha casa. Observo a rua. As árvores cresceram. As raízes da amendoeira em frente romperam o cimento da calçada. Uma grande rachadura deixa à mostra a terra por baixo. É tempo de amêndoas e nenhum morcego apareceu nos últimos anos. Onde teriam ido? Será que os gaviões que moram na torre de telefonia os espantaram?
Fizeram ninho, criaram filhotes. O tempo realmente passou. Lá se vão oito anos de história impressa no musgo da parede.
O jovem cão me olha com olhar interrogativo. O que pensas? pergunta ele calado. Não respondo, apenas fecho o portão e entro deixando do lado de fora as reflexões, a pátina do tempo e sua poesia, as rachaduras do muro e da calçada, e o resumo da história nos esporos das samambaias que crescem ao longo das paredes.

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